Muita gente já comentou, sei muito bem, mas
não posso me conter diante do discurso boçal pronunciado pelo senador Reditario
Cassol (PP-RO) propondo que se aplique o chicote aos presidiários brasileiros
que não trabalhem por serem “vagabundos” e “sem-vergonhas”.
Algumas observações, além da óbvia
constatação de que esse senhor não tem ideia de algo valorizado desde as
revoluções Americana e Francesa, no século XVIII, os direitos humanos:
1. O
senador ignora parte crucial da Constituição
Este senhor de nome espantoso mostrou com seu
discurso não ter condições mínimas de ocupar uma cadeira no Senado da República
– posto que ganhou de presente do filho, senador e ex-governador Ivo Cassol
(PP-RO), que, lançando mão de brecha na legislação eleitoral, recorreu à
prática imoral de escolher o pai como seu suplente.
Seja como for, é senador em exercício, e sua
fala atesta que sequer leu a Constituição, inclusive a parte crucial que, no
Título II, trata “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”: ali, o artigo 5º,
item XLVI, letra “e”, veda expressamente penas “cruéis”.
O artigo 5º é cláusula pétrea da Constituição
e, portanto, não pode ser alterado, como qualquer frequentador do começo do
primeiro grau no país deveria saber, ainda mais um senador.
2. O
senador manifesta total ignorância da situação dos presídios
Para os presidiários, longe do que imagina o
senador, a possibilidade de trabalhar seria uma bênção.
Como a esmagadora maioria das penitenciárias
não dispõem de qualquer instalação que permita aos presos trabalharem, centenas
milhares de sentenciados “neste país” apenas apodrece em prisões quase sempre
péssimas, amontoados em celas, sem nada para fazer o dia todo, seja trabalho,
estudo, esporte ou lazer, por anos ou mesmo décadas a fio – forma especialmente
diabólica de infernizar e embrutecer um ser humano.
Poder trabalhar costuma, diferentemente do
que imagina o senador, uma reivindicação de presos, porque isso, entre outras
vantagens: 1) permite ao preso aprender uma promissão; 2) propicia uma pequena
renda a sua família; 3) permite ao detento a diminuição da pena – conforme o
caso, a cada tantos dias de trabalho subtrai-se um dia de cadeia; 4) ajuda, por
meio do estímulo que o trabalo representa, a afastar o presidiário de
atividades ilegais na prisão.
3.
Suplicy fez um aparte correto, mas se esqueceu da “Revolta da Chibata”
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP), muito
corretamente, observou em aparte a Cassol que isso faria retroagir o país “à
Idade Média”. Mas se esqueceu o nobre senador de que foi preciso a cruenta
Revolta da Chibata (1910), liderara por um marinheiro, João Cândido, para que a
Marinha do Brasil acabasse eliminando os cartigos corporais então vigentes como
parte de seu código disciplinar e que incluía, justamente, como diz o nome da
rebelião, chibatadas.
4. O
discurso mostra o despreparo dos senadores-parentes e envergonha o país
O discurso do suplente de Ivo Cassol pela
única e exclusiva razão de que é seu pai, que está repercutindo no exterior e
envergonhando o país, mostra o grau de despreparo dos suplentes de senador
escolhidos pela atual forma – legal, mas obscena.
FONTE:
VEJA
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