Professora Fernanda Marinela
O Exame de Ordem, exigido aos
bacharéis em Direito para o exercício da advocacia, sempre foi um tema
polêmico. Atualmente o assunto volta a ter destaque não só pela existência de
projetos de Lei e projeto de emenda constitucional em trâmite no Congresso Nacional,
mas principalmente em razão das recentes decisões judiciais acerca da matéria.
Assim, para fomentar o debate resolvemos trazer ao nosso leitor uma síntese
sobre os principais pontos debatidos.
O Projeto de Lei nº 186/06, do
Senador Gilvam Borges (PMDB-AP), pretende acabar com o processo de seleção do
Exame de Ordem. A proposição altera a Lei nº 8.906, de 1994 com a revogação do
Inciso IV e o § 1º do art. 8º, o inciso VI do art. 58 e todo o art. 84 da Lei,
que regulamentam diversos aspectos do Exame.
Em sua justificativa o autor
defende a extinção do Exame por entender que o estudante de direito, para a
conclusão de seu curso, já é submetido a avaliações freqüentes, durante todo o
lapso de duração do curso e, além disso, submete-se também ao Exame Nacional de
Cursos, promovido pelo Ministério da Educação, que é, também, obrigatório e se
destina à avaliação dos cursos de direito, entre outros. Ainda, sustenta que a
aplicação do exame de ordem constitui fonte de estresse e, não raro, de
problemas temporários de saúde para os candidatos.
Foi apresentada uma emenda a este
projeto que sugere o aperfeiçoamento na avaliação e não a sua extinção. Para
tanto, propõem a introdução de novos parágrafos no art. 8º da Lei nº 8.906, de
1994, para estabelecer novos critérios de administração do exame, de maneira a
fixar a periodicidade mínima do exame e a forma de aplicação. Ademais,
garante-se, ao aprovado na primeira fase a possibilidade de prestar a segunda
sem ter de se submeter novamente à primeira, durante o período de um ano.
Em abril deste ano, o senador
Gerson Camata (PMDB-ES) apresentou requerimento, aprovado pelos senadores, para
que o PLS 186/06 tramite em conjunto com o Projeto de Lei 43/09, do Senador
Marcelo Crivella (PRB/RJ). O PLS 43/09 estabelece novo critério de avaliação de
cursos e instituições de ensino superior, a partir do desempenho de seus
egressos em exames de proficiência profissional. A proposta é alterar a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (LDB) para que a União, juntamente com entidades
profissionais, promova exames de proficiência para egressos de cursos de
graduação, de modo a condicionar o reconhecimento dos cursos das instituições
de ensino ao desempenho médio dos seus formados.
Existe ainda uma proposta de
Emenda à Constituição (PEC 1/10), de autoria do Senador Geovani Borges
(PMDB-AP) que pretende proibir a realização de exames da Ordem, estabelecendo
que "diploma de curso reconhecido e oferecido por instituição de educação
superior devidamente credenciada constitui comprovante de qualificação
profissional para todos os fins". Essa proposta tramita na Comissão de
Constituição e Justiça, onde é relatada pelo senador Demóstenes Torres
(DEM-GO).
No âmbito jurídico, a principal
decisão é a tomada pelo Supremo Tribunal Federal, ao reconhecer, no Recurso
Extraordinário nº 603583 , repercussão geral na controvérsia sobre a
constitucionalidade do artigo 8º, §1º da Lei 8.906/94 e dos Provimentos nº
81/96 e 109/05 do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que
condicionam o exercício da advocacia à prévia aprovação no Exame de Ordem.
O Recurso Extraordinário nº
603583, que tem como relator o Min. Marco Aurélio, advém da decisão proferida
pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que não considerou o exame de ordem
inconstitucional, afirmando que o Conselho Federal da OAB observou os limites
de sua competência e que a exigência de aprovação no Exame de Ordem como
requisito para advocacia não conflitaria com o principio da liberdade
profissional previsto no art. 5º, inciso XIII da Carta Magna.
Os argumentos dos recorrentes são
os seguintes:
a) É
atribuição de cada instituição de ensino superior certificar se o bacharel é
apto para exercer as profissões da área jurídica;
b) A
autorização constante no art. 8º da Lei 8.906/94 para regulamentação do Exame
de Ordem pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil afronta o
principio da legalidade e usurpa a competência privativa do Presidente da República
para regulamentar leis;
c) Aponta
violação a inúmeros princípios;
d) Afirma
que a exigência da aprovação no Exame de Ordem representa censuraØ prévia ao
exercício profissional; e
e) Sustenta
que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9394/96, já
regulamenta, para todas as profissões, o art. 205 da Constituição Federal.
Para o Min. Marco Aurélio,
estamos diante de uma situação concreta que atinge milhares de pessoas em face
de inúmeros processos em âmbito nacional sobre o assunto e que o fato de
bacharéis em Direito em todo o país se insurgirem contra o Exame de Ordem sob a
argumentação de que há obstáculo de forma setorizada ao exercício da profissão,
exige pacificação da matéria por parte da Suprema Corte. A decisão foi
publicada no Diário Oficial do dia 16 de abril de 2010.
O Superior Tribunal de Justiça já
se manifestou sobre o assunto no ano de 2000. Na decisão proferida no Resp
214.671/RS, relatada pelo Min. Humberto Gomes de Barros, a Primeira Turma, de
forma clara e contundente, afirma que não se deve confundir o status de
bacharel em direito com o de advogado. Leciona: “bacharel é o diplomado em
curso de Direito. Advogado é o bacharel credenciado pelo Estado ao exercício do
jus postulandi”. Prossegue afirmando que a seleção de bacharéis para o
exercício da advocacia deve ser tão rigorosa como o procedimento para escolha
de magistrados e agentes do Ministério Público, concluindo que “não é de bom
aviso liberalizá-la”. Salienta que a inscrição na OAB é “ato-condição que
transforma o bacharel em advogado”.
Aqueles que defendem a extinção
da seleção do Exame de Ordem apresentam como argumentos, dentre outros, a fragilidade
das provas, que não avaliam seriamente os candidatos, seja pela grande
quantidade de questões dúbias e passiveis de anulação sejam pelo rigor
excessivo e desnecessário em algumas avaliações já ocorridas. È também objeto
de crítica o índice altíssimo de reprovações que, para alguns, acaba
caracterizando uma fonte de arrecadação para autarquia tendo em vista o valor
alto das inscrições para participar do certame.
Há ainda o argumento de que o
Conselho Federal da OAB não tem a atribuição de “qualificar”, não sendo o Exame
de Ordem capaz de propiciar qualquer qualificação, cabendo somente às
instituições de ensino superior estabelecer a formação e qualificação para o
exercício da profissão. Fundamento utilizado na decisão liminar proferida no
Mandado de Segurança nº 2007.51.01.027448-4 que tramitou na 23ª Vara Federal do
Rio de Janeiro que favoreceu temporariamente os impetrantes. Ocorre, porém, que
a decisão teve sua execução suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 2ª
Região.
As reprovações passaram a
revelar, segundo alguns, o retrato nefasto da má-qualidade no ensino superior
para a carreira jurídica. Esta questão tem sido apresentada como argumentos
tanto favoráveis como contra a extinção da seleção do Exame de Ordem.
É certo que é imprescindível um
debate sério e efetivo no que se refere à qualidade do ensino jurídico,
entretanto, o ponto suscitado quanto à avaliação da OAB é que eliminá-la seria
propiciar que profissionais sem o mínimo de qualificação exercessem “função
essencial à justiça” de maneira inconseqüente e sem qualquer controle, trazendo
danos irreparáveis à sociedade. Há aqueles que entendem que o Exame de Ordem
não possui credibilidade e nem irá de forma alguma “corrigir” os erros das
instituições de ensino, mas apenas penalizar o candidato. O senador Gilvam
Borges afirma: “o exame não tem como avaliar de modo adequado a capacidade
técnica do candidato a advogado. Se a intenção do exame é avaliar o desempenho
das instituições de ensino não nos parece razoável que o ônus recaiam sobre o
aspirante a advogado”.
No calor desta discussão, outras
categorias começam a exigir avaliação prévia para o exercício de suas
profissões. No dia 14 de junho foi publicada a Lei 12.249/2010 que exige aos
bacharéis em Ciências Contábeis a aprovação no Exame de Suficiência para
exercer a profissão de Contabilista. Os detalhes da nova certificação e a
fiscalização serão de responsabilidade do Conselho Federal de Contabilidade
(CFC) e dos Conselhos Regionais.
Percebe-se, portanto, que
inúmeros são os argumentos tanto para a continuidade como para a extinção do
Exame de Ordem. A discussão envolve tanto aspectos jurídicos quanto políticos.
Enquanto se aguarda a decisão do Supremo Tribunal Federal e o trâmite das
propostas de leis e também da emenda à Constituição, é salutar que se faça uma
reflexão sobre a questão.
Assim, convido a todos a para
deixarem sua opinião aqui abaixo!!
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